segunda-feira, 18 de maio de 2009

Abuso Inaceitável

No dia 18 de maio de 1973, no município de Vitória, no Espírito Santo, a menina Araceli Cabrera Sanches, foi sequestrada, violentada sexualmente e assassinada, aos oito anos de idade.

Embora o crime permaneça impune, virou símbolo; por isso, desde o ano 2000, assinala-se nesta data o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes.

Hoje, 36 anos após a morte brutal de Araceli, as ações de enfrentamento mobilizam o poder público, entidades não governamentais e o setor privado.

O abuso sexual de crianças e adolescentes é uma tragédia nacional. Estima-se que no Brasil, a cada dia, 165 crianças ou adolescentes sejam vítimas deste tipo de crime, a absoluta maioria deles cometidos dentro de casa.

Nos últimos vinte anos, a sociedade tem-se mobilizado intensamente para dar respostas à altura do desafio que a situação exige. Muito já foi feito, mas ainda há um longo caminho a percorrer até que todas as crianças e adolescentes brasileiros tenham assegurado o direito à integridade física e psíquica.

Um marco nessa luta foi a instauração, em 1993, da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Exploração Sexual. A divulgação do relatório da CPI chamou a atenção da sociedade para a gravidade do problema e provocou a mobilização de importante setores da sociedade civil, dos três poderes da Republica, da mídia e de organismos internacionais no combate ao abuso sexual de crianças e adolescentes.

No ano passado, foi instalada a CPI da Pedofilia, como consequência da Operação Carrossel I, da Polícia Federal, que desbaratou uma rede de pedófilos na internet. Depois de rastrear por seis meses a troca de arquivos pornográficos na rede, a Polícia Federal obteve 103 mandados de busca e apreensão em catorze estados, além do Distrito Federal. Mas como, até então, só se podia prender em fragrante quem estivesse enviando ou recebendo arquivos ilegais no momento em que fosse abordado pela polícia, apenas três prisões foram efetuadas. A posse de material pornográfico infantil não era crime, mas hoje é.

Esta e outras importantes modificações na nossa legislação muito têm contribuído para diminuir a impunidade nestes casos. Hoje o Brasil é reconhecido como um País especialmente bem sucedido na articulação entre Governo e sociedade, para fins da garantia dos direitos da infância e adolescência.

O Poder Executivo começou a dar uma resposta mais sistemática a esse desafio no Governo Fernando Henrique Cardoso, com a instituição do Programa de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes, inserido no Plano Plurianual a partir de 2000.

Em 2003, logo após a primeira reunião ministerial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou que o combate à violência sexual contra crianças e adolescentes era prioridade de seu Governo, e transferiu a coordenação do programa para a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República.

No mesmo ano, foi implantado o Disque Denúncia de Abuso e Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes. Entre maio de 2003 e fevereiro deste ano, o Disque Denúncia nacional realizou 2 milhões 220 mil 524 atendimentos e encaminhou 89 mil 464 denúncias em todo o País.

De acordo com a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, o abuso sexual representa 57,99 por cento dos casos denunciados, seguido pela exploração sexual comercial, com 40,27 por cento dos casos, pornografia, com 1,73 por cento e tráfico de crianças e adolescentes, com 0,75 por cento. As denúncias são encaminhadas aos órgãos de segurança pública estaduais, e os denunciantes têm sigilo garantido.

Outra importante frente de combate ao crime sexual contra a infância e a adolescência é o rastreamento da pedofilia pela internet. De 2006 a 2008, a SaferNet Brasil, organização não governamental destinada a combater este tipo de crime, recebeu denúncias sobre 109 mil páginas eletrônicas com conteúdo pornográfico infantil. As que revelavam indícios de crime foram encaminhadas ao Ministério Público e à Polícia Federal.

Uma característica comum nas crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual é a dificuldade que têm em falar sobre o assunto e denunciar o agressor. Para lidar com esta realidade, governos, universidades e organizações não governamentais têm trabalhado para ensinar professores e autoridades a perceber os sinais de abuso.

O projeto Escola que Protege, do Ministério da Educação, busca treinar professores da rede pública e funcionários da Justiça em 17 municípios considerados vulneráveis à exploração sexual.

A ONG WCF Brasil trabalha no mesmo sentido. No primeiro ano de trabalho do projeto Childhood, a WCF já tornou mil profissionais capacitados para saber quais os direitos da infância e adolescência, quais as políticas públicas voltadas para esta faixa etária, o que é violência sexual e o que distingue o abuso da exploração.

Este trabalho é de suma importância, porque a sociedade tem uma função primordial no combate a este tipo de violência – romper o manto de silêncio que quase sempre permite a impunidade do agressor e a perpetuação do crime, às vezes ao longo de anos.

Abuso sexual dentro da própria família, exploração sexual para fins comerciais, prostituição, pornografia e tráfico de crianças e adolescentes são gravíssimas violações dos direitos humanos e como tal devem ser denunciadas e punidas.

A nós, parlamentares, cabe continuarmos em permanente alerta para aperfeiçoar cada vez mais nossa legislação, com o objetivo de promover um cerco implacável aos autores de crimes tão abjetos.

Só com o esforço conjunto e continuado de toda a sociedade conseguiremos assegurar proteção efetiva à integridade física e psíquica de nossas crianças e adolescentes.

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